Definição. A Linha SOS Voz Amiga, foi criado em 1978 pela Liga Portuguesa de Higiene Mental, uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) que lhe dá suporte legal.
Enquadramento. Foi o primeiro telefone de ajuda, na área da prevenção do suicídio, que surgiu em Portugal, 35 anos depois de um sacerdote inglês, Chad Varah, ter dado início a esta forma de ajuda, colocando o seu telefone ao dispor de pessoas em risco de suicídio e anunciando-o nos jornais.
Público-alvo. É uma linha telefónica de emergência, destinada a pessoas em sofrimento, como forma de prevenir o suicídio. É assegurado exclusivamente por voluntários, que recebem formação prévia de profissionais experientes na área da Saúde Mental e se mantêm num sistema de formação contínua.
Principais Objectivos. 1. Partilhar os problemas com alguém desconhecido, que não julga, mas ouve e se sente nesse momento responsável pelo outro, tentando devolver-lhe a confiança em si próprio. 2. Relatar situações de sofrimento pessoal sem constrangimentos de ordem moral, sexual, religiosa ou política. 3. Encontrar pessoas que aceitam falar das ideias de morte, permitindo eventualmente afastar a ideia de suicídio. 4. Conversar com alguém que se interesse pelos seus problemas e angústias.
Grupo de ajuda. No Centro SOS – Voz Amiga a ajuda é prestada por um conjunto de pessoas – os voluntários – mulheres e homens de todas as idades, crenças, estratos sociais, culturais, económicos e profissionais que, sem qualquer remuneração, fazem um trabalho especializado de relação de ajuda não profissional, embora com formação inicial e contínua e o apoio e supervisão de técnicos da área da saúde mental.
Entrevista:
1) Qual(ais) a(s) actividade(s) desenvolvida(s) pela Voz Amiga?
O Centro SOS-Voz Amiga é um serviço de ajuda em situações agudas de sofrimento causadas pela Solidão, Ansiedade, Angústia, Depressão e Risco de Suicídio.
2) A SOS Voz Amiga diz respeito a uma linha de aconselhamento momentâneo ou uma linha de continuidade (uma linha que acompanha o mesmo problema, com os mesmos agentes)?
É uma linha de ajuda pontual. Mas não nos consideramos uma linha de aconselhamento.
3) Por norma, que tipo de situações ou problemáticas são apresentadas pelo(a)s cidadãos ou cidadãs, aquando de uma abordagem aos vossos serviços?
Perfil dos problemas mais apresentados:
• Relações humanas: conjugais, div, familiares, sentimentais, afectivos: ano de 2003 – 1362 efectivos e ano de 2007 – 1165 efectivos.
• Solidão, medo, questões éticas e morais: ano de 2003 – 1857 efectivos e ano de 2007 – 1183 efectivos.
• Doenças psicológicas, físicas, dependências: ano de 2003 – 1800 efectivos e ano de 2007 – 1451 efectivos.
• Suicídio, pensamento, tentativa: ano de 2003 – 227 efectivos e ano de 2007- 260 efectivos.
4) Consideram que o vosso desempenho segue a linha da defesa e promoção dos “direitos humanos”? Em que sentidos?
Em tese todos os indivíduos têm direito a uma vida saudável e a ser felizes, sendo que a OMS considera saúde como um conceito abrangente que engloba o bem-estar físico, mental e social. Nessa medida, o SOS – Voz Amiga prossegue a defesa e promoção dos direitos humanos de cada apelante, não sendo esse, contudo, o princípio subjacente à sua missão.
5) Por norma, que tipo de apoio é prestado a um cidadão ou a uma cidadã, depois de um telefonema, independentemente do problema em causa?
Acabado o telefonema, não há da nossa parte qualquer tipo de apoio. O nosso trabalho é realizado exclusivamente ao telefone enquanto dura o telefonema do apelante.
6) Aquando de uma orientação dada pelos vossos serviços, a maneira como homens e mulheres reagem à mesma é distinta ou equivalente? Isto é, a variável “género” pode ser uma condicionante para a reacção ao problema posto em causa?
Como explicado acima, não damos orientações. O que talvez possamos dizer, a este propósito, é que as mulheres recorrem mais a este tipo de ajuda do que os homens, como, aliás, se depreende dos dados estatísticos anexos. Por outro lado, constata-se que existe um maior número de suicídios no género masculino que no feminino.
7) É relevante dizer-se que o trabalho desenvolvido pelos vossos serviços contribui, grandemente, para a manutenção da ordem social e individual, da coesão social e individual e para a tentativa de equilíbrio de os desvios sentimentais, mentais, psíquicos e outros que fazem parte do ciclo de vida?
A coesão interior de cada indivíduo em dificuldade é o nosso principal objectivo e a coesão social começa em cada um de nós individualmente. O que podemos dizer é que tentamos contribuir para a ordem e equilibro individual de quem nos telefona, tentando atenuar os desvios de qualquer ordem na medida do possível. Mas, sobretudo, esforçamo-nos por perceber o seu sofrimento e tentamos passar essa mensagem: “estamos ali para partilhar com aquela pessoa o sofrimento em que está mergulhado”. Se isso lhe trouxer alívio e maior harmonia, tanto melhor, daremos o nosso objectivo por atingido.
8) O meio social de origem, as relações familiares passados ou presentes, o maior ou menor fechamento social, entre outros factores, são determinantes ou influentes na maneira como cada actor social enfrenta o seu problema. Concordam com esta ideia? Se sim, como a explicam, recorrendo à vossa experiência na Voz Amiga? O SOS – Voz Amiga não nos dá uma visão diferente da sociedade e das pessoas em geral, apenas nos põe mais em contacto com pessoas que num dado momento se sentem fragilizadas, qualquer que seja o motivo. É evidente que a afirmação contida nesta pergunta é verdadeira (todos nós somos “nós e a nossa circunstância”), contudo, esquece um factor da maior importância: a saúde e as condições de ordem estritamente bio-fisiológica de cada um.
9) Actualmente, fala-se de uma sociedade desarticulada de valores, princípios, regras, de traços culturais que as caracterizam; de uma sociedade atrofiada em matéria de “normas”. Acham que este atrofio social, baseado na quebra de regras, poderá ser uma das causas ou agravantes da debilidade psíquica, física e de outra natureza e, nos limites, de estados anómicos como o suicídio? De que forma?
No SOS – Voz Amiga não estamos preocupados com as causas, nem tomamos partido por esta ou aquela explicação qualquer que seja o tema em debate. O cerne da nossa missão é o sofrimento de quem nos telefona, pelo que “a sociedade” para o nosso trabalho é uma entidade inexistente. As razões que levam aquela pessoa a telefonar não nos interessam: apenas está a sofrer e vem partilhar connosco a sua dor que nós, de alguma forma, tentamos aliviar. Nem sequer nos atrevemos a catalogar o suicídio como um estado anómico ou não. Se fizéssemos juízos de valor, não estaríamos disponíveis para nos solidarizarmos com a dor de qualquer pessoa que pensasse de modo diferente do nosso.
Entrevista realizada por: Ana Ferreira
Um bem – haja a toda a equipa da Voz Amiga. Mais informações: AQUI!